segunda-feira, 20 de agosto de 2012

AS: "VOGAIS" E O HEBRAICO: SINAIS MASORÉTICOS:

COMO SURGIRAM OS SINAIS MASSORÉTICOS?
Por Jones Mendonça

A escrita hebraica antiga não possuía vogais. A vocalização das palavras era transmitida pela tradição, de pai para filho. Quando um judeu se deparava com a palavra hebraica דוד  - dálet (d), vav (v), dálet (d) - por exemplo, sabia que era uma referência a David, o grande rei israelita.  Com o tempo surgiu o receio de que a pronúncia correta das palavras fosse perdida, já que o hebraico era falado apenas por uma pequena parte da população, com uso estritamente litúrgico.

As primeiras experiências com sinais que pudessem ajudar na vocalização dos textos foram feitas com o Talmude, coleção de escritos sagrados do judaísmo. Comunidades judaicas que viviam na Palestina e na Babilônia, no século V, desenvolveram uma série de pontos vocálicos que ficavam acima das consoantes. Por volta de 900 d.C o sistema tiberiense suplantou os métodos palestinense e babilônico colocando os pontos abaixo das consoantes. Esses pontos vocálicos foram acompanhados de acentos que serviam para dar ritmo ao texto que era lido nas sinagogas. Veja abaixo um texto hebraico de Gn 1,1 com e sem os sinais vocálicos:

Além dos sinais vocálicos e acentos também foram feitos comentários críticos em notas marginais do texto que tinham a função de identificar grafias fora do comum, palavras e formas gramaticais e até mesmo o número de letras contidas no texto. Essas notas eram chamadas de Massora (tradição) e os responsáveis pelas notas de Massoretas. Os sinais e acentos ficaram conhecidos como “sinais massoréticos”.

A padronização dos sinais e pontuação criados pelos massoretas se deu por volta do século X com o trabalho das famílias ben Asher e ben Naphtali. Uma dessas famílias, a de Ben Asher, foi responsável pela produção de importantes códices, tais como o Códice do Cairo (895 d.C.), o Códice Alepo (900-950 d.C.) e o Códice Leningrado (1008 d.C.). Os registros contidos nesses códices são conhecidos como textos massoréticos. O texto do Antigo Testamento que consta atualmente em nossas Bíblias é baseado nos textos massoréticos.

Referências bibliográficas:
GOTTWALD, Norman K. Introdução socioliterária à Bíblia hebraica. Tra­dução de Anacleto Alvarez. São Paulo: Paulinas, 1988.
E-SWORD. the sword of the lord with an eletronic edge. 2007. Software de Ferramentas e Comentários Bíblicos.
 Não importa em que língua leia a Bíblia, parte do livro foi provavelmente traduzida direta ou indiretamente do texto massorético, que abrange o Antigo Testamento. Na realidade, havia mais de um texto massorético. Assim, qual deles foi escolhido, e por quê? Afinal, o que é o texto massorético, e como sabemos que é confiável?
A palavra de Yehowah: A escrita da Bíblia começou junto ao monte Sinai, em 1513 AEC. Êxodo 24:3, 4, nos diz: “Moisés foi então e relatou ao povo todas as palavras de Yehowah e todas as decisões judiciais, e todo o povo respondeu de uma só voz e disse: ‘Todas as palavras que Yehowah falou estamos dispostos a fazer.’ Concordemente, Moisés assentou por escrito todas as palavras de Yehowah.”

As Escrituras Hebraicas continuaram a ser registradas por mais de mil anos, desde 1513 AEC até por volta de 443 AEC. Visto que os escritores foram inspirados por Deus, é razoável que ele dirigisse as coisas de tal forma que Sua mensagem ficasse fielmente preservada. (2 Samuel 23:2; Isaías 40:8) Todavia, será que isso significa que Deus excluiria todo e qualquer erro humano, para que não se mudasse nem uma só letra na produção de cópias?
Entreabriu-se a porta para inexatidões: Embora fossem homens com profundo respeito pela Palavra de Deus que a copiaram geração após geração, ainda assim introduziu-se certo grau de erro humano nos manuscritos. Os escritores da Bíblia foram inspirados, mas os copistas não fizeram seu trabalho sob inspiração divina.

Depois de os judeus retornarem do exílio babilônico, em 537 AEC, eles adotaram um novo estilo de escrita que usava letras quadradas, aprendido em Babilônia. Esta grande mudança trouxe consigo o problema inerente de que certas letras de aspecto similar podiam ser confundidas uma com a outra. Visto que o hebraico é uma língua baseada em consoantes, às quais o leitor acrescenta os sons vocálicos segundo o seu entendimento do contexto, a troca de uma consoante podia facilmente alterar o sentido duma palavra. Na maioria dos casos, porém, esses erros teriam sido descobertos e corrigidos.

A vasta maioria dos judeus não retornou a Israel depois da queda de Babilônia. De modo que as sinagogas tornaram-se os centros espirituais para as comunidades judaicas em todo o Oriente Médio e na Europa.[1] Cada sinagoga precisava de cópias dos rolos das Escrituras. Com a multiplicação das cópias, aumentou também a probabilidade de ocorrerem erros de copista.
Tentativas para fechar a porta: A partir do primeiro século EC, escribas em Jerusalém tentaram produzir um texto padrão, pelo qual todos os outros rolos das Escrituras Hebraicas pudessem ser corrigidos. Todavia, não havia nenhum sistema específico para diferenciar um texto original dos manuscritos que continham erros de copista. A partir do segundo século EC, o texto consonantal das Escrituras Hebraicas parece ter ficado bastante padronizado, embora ainda não especificado como autoridade. As citações das Escrituras Hebraicas que constam no Talmude (compilado entre o segundo e o sexto século EC) indicam com muita frequência uma fonte diferente daquela que mais tarde ficou conhecida como o texto massorético.

A palavra hebraica para “tradição” é
masohráh ou masóreth. Por volta do sexto século EC, aqueles que guardavam a tradição de copiar com exatidão as Escrituras Hebraicas passaram a ser conhecidos como massoretas. As cópias que produziram são chamadas de textos massoréticos. O que havia de especial no seu trabalho e nos textos que preparavam?

O hebraico tinha deixado de ser a língua nacional, viva, e muitos judeus não mais a falavam. Portanto, o próprio entendimento do texto bíblico consonantal estava em perigo. A fim de protegê-lo, os massoretas desenvolveram um sistema de vogais representadas por pontos e traços, também chamados de sinais. Eram colocados acima e abaixo das consoantes. Os massoretas desenvolveram também um complexo sistema de sinais que serviam tanto como forma de pontuação como qual guia para uma pronúncia mais exata.

Onde os massoretas achavam que o texto tinha sido alterado ou copiado de forma incorreta por gerações anteriores de escribas, eles, em vez de mudarem o texto, faziam anotações nas margens laterais. Anotavam formas e combinações incomuns de palavras, bem como a frequência com que ocorriam em determinado livro ou nas Escrituras Hebraicas como um todo. Anotavam-se também comentários adicionais para ajudar os copistas a fazer verificações. Desenvolveu-se um sistema de “códigos” abreviados para registrar estas informações com extrema brevidade. Nas margens superiores e inferiores, um tipo de miniconcordância alistava partes de versículos relacionados, comentados nas notas das margens laterais.

O mais célebre sistema foi aperfeiçoado pelos massoretas de Tiberíades, junto ao mar da Galiléia. As famílias de Ben Asher e de Ben Naftali, do nono e do décimo século EC, possivelmente caraítas, chegaram a ter destaque especial.[2] Embora houvesse diferenças entre os métodos de pronúncia e as notas marginais destas duas escolas, as consoantes dos seus textos diferem em menos de dez lugares em todas as Escrituras Hebraicas.

Ambas as escolas de massoretas, a de Ben Asher e a de Ben Naftali, fizeram na sua época uma grande contribuição para a erudição textual. Depois que Maimônides (um influente erudito talmúdico do século 12) elogiou o texto de Ben Asher, outros deram-lhe preferência exclusiva. Isto chegou ao ponto de que atualmente não se pode achar nenhum manuscrito de Ben Naftali. Tudo o que resta são listas de diferenças entre as duas escolas. Ironicamente, o comentário de Maimônides relacionava-se com considerações estilísticas, tais como o espacejamento de parágrafos, e não com os aspectos mais importantes da transmissão exata do texto.
É possível achar um texto massorético “puro”: Há muita disputa entre os eruditos sobre que códice hoje disponível é o texto “puro” de Ben Asher, como se isso nos fornecesse então o “verdadeiro” texto massorético. Na realidade, nunca houve um único texto massorético “puro”, autorizado. Antes, havia muitos textos massoréticos, cada um deles um pouco diferente dos outros. Todos os códices existentes são textos mistos, com versões tanto de Ben Asher como de Ben Naftali.

A tarefa com que qualquer tradutor das Escrituras Hebraicas se confronta hoje é enorme. Ele não só precisa familiarizar-se com o texto hebraico, mas também com todas as opções razoáveis onde o texto talvez tenha sido alterado por um erro de copista ou de outro modo. Embora os diversos textos massoréticos lhe sirvam de base, ele precisa consultar outras fontes válidas, que possam razoavelmente representar versões mais antigas e talvez mais exatas do texto consonantal.

Na introdução do seu livro
The Text of the Old Testament, Ernst Würthwein explica: “Quando nos confrontamos com uma passagem difícil, não podemos simplesmente reunir as diversas versões e escolher aquela que parece oferecer a solução mais simples, às vezes preferindo o texto hebraico, outras vezes a Septuaginta e ainda em outras ocasiões, o Targum Aramaico. As evidências textuais não são todas igualmente confiáveis. Cada uma tem seu próprio caráter e sua própria história peculiar. Temos de estar familiarizados com elas se esperamos evitar soluções inadequadas ou falsas.”

Temos uma base firme para ter plena confiança em que Yehowah preservou a sua Palavra. Pelos esforços conjuntos de muitos homens sinceros no decorrer de séculos, temos à nossa disposição a essência, o conteúdo e até mesmo os pormenores da mensagem da Bíblia. Qualquer ligeira diferença numa letra ou numa palavra não tem afetado nosso entendimento das Escrituras. Agora, a pergunta importante é: viveremos nós em harmonia com a Palavra de Deus, a Bíblia?





_____________
Notas:
[1] Visto que muitos dos judeus fora de Israel não mais eram leitores fluentes do hebraico, essas comunidades judaicas, tais como a de Alexandria, no Egito, logo perceberam a necessidade de traduções da Bíblia para o vernáculo. Para preencher esta necessidade, preparou-se a versão Septuaginta grega, no terceiro século AEC. Esta versão tornou-se mais tarde uma importante fonte de comparação de textos.
[2] Por volta do ano 760 EC, um grupo de judeus conhecido como os caraítas exigiu a aderência mais estrita às Escrituras. Por rejeitarem a autoridade dos rabinos, a “Lei Oral” e o Talmude, eles tinham um motivo maior para proteger o texto bíblico de forma sistemática. Certas famílias deste grupo tornaram-se peritos copistas massoréticos.








Nenhum comentário:

Postar um comentário