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Transliteração,
em sentido estrito, é um mapeamento de um
sistema de escrita em outro. Tenta ser sem perdas, isto é, o leitor informado deve poder reconstruir a ortografia original de palavras transliteradas que desconhece. Para consegui-lo, deve definir convenções complexas sobre como transliterar letras que não têm correspondência direta na escrita de destino.
Romaji, por exemplo, é um método de transliteração.
Na prática corrente, transliterar é
transcrever a escrita de um alfabeto em outro. No caso da
língua portuguesa, a transliteração é o processo de transcrição de outros alfabetos para o
alfabeto latino de 26 letras (sem outros sinais), com a
acentuação correspondente quando necessária.
Obviamente, a transliteração
não afeta idiomas que já usam o alfabeto latino, como
inglês,
francês,
alemão e a maioria das línguas européias. Nesses casos, usam-se todas as letras, acentos e sinais
diacríticos do original.
Algumas línguas que precisam ser transliteradas para o português são o
árabe, o
hebraico, o
russo, o
búlgaro, o
mandarim, o
japonês, o
tailandês e o
hindi-
urdu, entre várias outras. Por outro lado, algumas línguas completamente distintas do português utilizam alfabeto latino, dispensando esse processo – é o caso do
turco, do
húngaro e do
vietnamita. Nestes casos, são usadas regras complexas de acentuação e diacríticos (
trema,
til,
cedilhas). Quando, por motivos técnicos, não for possível reproduzir o caractere exato, recomenda-se usar a letra mais semelhante (como
S para
Ş ou
T para
Ŧ).
Um caso peculiar é o
servo-croata, que usa simultaneamente os alfabetos latino e cirílico. Nesse caso, não é preciso um padrão de transliteração, já que toda palavra tem grafia nas duas escritas.
Um mesmo alfabeto pode ter diferentes padrões ortográficos de transliteração dependendo do idioma em que é usado. O
alfabeto árabe, por exemplo, é usado para escrever em
árabe,
persa e
berbere – três línguas sem nenhum parentesco. O mesmo acontece com o cirílico, alfabeto usado para escrever em
ucraniano (uma língua eslava),
mongol (altaica) e
cazaque (túrquica). Mesmo usando alfabetos iguais, cada língua tem um conjunto de sons diferentes, e por isso exige uma tabela exclusiva de associação com as letras latinas.
A maior parte das línguas nativas ameríndias (
tupi,
quíchua,
asteca) não é propriamente transliterada, mas sim grafada direto em alfabeto latino, já que não tinha uma escrita original (exceções são o
Cherokee nos
EUA e as
línguas esquimós no
Canadá, que possuem alfabetos próprios).
O chinês é uma das poucas línguas que têm padrões universais de transliteração para alfabeto latino (também chamada “romanização”). Existem dois: o
Wade-Giles, criado por estudiosos ingleses no
século XIX, e o
Pinyin, adotado oficialmente pelo governo de Pequim, que solicita à imprensa mundial que o use. Pelo Wade-Giles, o nome do líder da
Revolução Chinesa se escreve “Mao Tse-tung”. Pelo Pinyin, é “Mao Zedong” (embora a pronúncia seja mais próxima de "Mao Tse-tung", algo como ""Dze Tung").
O
Brasil tem um padrão ortográfico de transliteração disseminado pelo
Dicionário da Língua Portuguesa de
Aurélio Buarque de Hollanda. É o padrão seguido pela imensa maioria das enciclopédias, dicionários e obras de referências redigidas originalmente em
português brasileiro (ou seja, excluindo-se as obras traduzidas, como a
Larousse e a
Britannica). Por ele, é definido que a transliteração deve ser feita usando-se somente as letras do nosso alfabeto e a acentuação gráfica quando necessária, de forma a tornar a grafia a mais próxima possível da pronúncia original.
No entanto, esse padrão muitas vezes é desobedecido, por desconhecimento ou preferência de padrões de outras línguas, como o inglês, o alemão e o francês.
O espanhol tem um padrão relativamente rígido de transliteração. Ele também segue a mesma lógica de escrever como se pronuncia, mas obviamente utilizando as letras de acordo com o som que têm em castelhano. Esse padrão é usado para todas as línguas, de árabe a russo. Por causa disso, vemos nomes como "Ajmed", "Yibrán" e "Jaled", quando estamos acostumados a escrever "Ahmed", "Gibran" e "Khaled".
No entanto, o padrão espanhol costuma tomar mais cuidado com a pronúncia original do que a grafia brasileira, que induz a erro. Pouca gente sabe, por exemplo, que os nomes russos "
Vladimir" e "
Boris" são pronunciados com as tônicas em /vlaDImir/ e /boRIS/, não como /vladiMIR/ nem /BOris/. Por isso, o acento em 'Vladímir' deve ser mantido, enquanto 'Boris' jamais deve ser acentuado (i.e., "Bóris").
Como a ortografia da língua portuguesa se parece mais com a francesa para as consoantes (comparar sons de
J,
CH,
R,
QU,
S e
SS) e com espanhol e italiano para as vogais (
A,
E,
I,
O,
U, semivogais I e U), os padrões de transliteração para português devem ser híbridos entre estas formas – mas, em geral, a forma francesa é a que mais se aproxima da nossa pronúncia. Basta constatar com exemplos como “Jaled” (esp.), “Haled” (it.) e “Khaled” (fr.), ou “Jruschov” (esp.), “Hruščov” (it.) e “Krouschov” (fr.). A única mudança necessária, no último caso, seria trocar o francês “ou” pelo “u” português.
A consulta a diferentes grafias pelo
Google muitas vezes não é recomendada, pois pode induzir a erros e
estrangeirismos. Por motivos óbvios, grande parte do conteúdo disponível na internet é escrita em inglês, e nesses casos os nomes que precisam de transliteração seguem o padrão anglófono. Raramente esse padrão vai coincidir com a forma correta no idioma português, pois a ortografia inglesa tem pouco em comum com a portuguesa (não tem o som de /j/, por exemplo, e por isso escreve /zh/). Além disso, não custa lembrar que a forma usada pela maioria nem sempre é a correta.
No
Brasil, os órgãos de
imprensa costumam publicar manuais de redação e estilo que trazem recomendações sobre os padrões de transliteração a serem adotados no texto jornalístico. Há variações entre eles, mas a maioria concorda com o princípio de que
os nomes de outro alfabeto devem ser escritos pela ortografia brasileira (sem K, Y ou W, nem SH ou ZH)
segundo o padrão que mais se aproxima da pronúncia original.
Eis o que dizem os manuais de redação de quatro dos principais jornais brasileiros:
Jornal do Brasil – “Para os nomes estrangeiros de línguas que não usam o nosso alfabeto, emprega-se grafia aproximada do som da palavra, sem imitar a grafia inglesa ou francesa. Pode haver também uma convenção internacional, como a que é empregada para grafia de nomes chineses. Esses casos requerem freqüentemente consulta aos redatores ou editores. (...) Devem ter seus nomes grafados de acordo com a ortografia em vigor no Brasil.” “Nomes indígenas - No Jornal do Brasil, os tupis são os tupis e não os Tupi. Os ianomãmis não são os Yanomami; os caiapós não são os Kaiàpó. A grafia no singular, com inicial maiúscula e usando eventualmente as letras k, w e y, é adotada em ciências sociais, por necessidades específicas de obediência a normas internacionais. Não há por que seguir tais normas no jornal.”
O Globo – “Para nomes próprios em idiomas que usam outros alfabetos, emprega-se, com algum grau de arbitrariedade, a grafia simplificada aproximada do som da palavra, sem imitar a grafia inglesa ou francesa. Assim: Kruchov, e não Kruschev (inglês) ou Khroutchev (francês). Escrevemos Gorbatchov e Tchernóbil. Apesar do critério fonético, prefere-se ‘K’ a ‘C’ em atenção ao uso.” “Nomes de tribos indígenas são grafados no plural: os xavantes, os tupis, os guaranis, os apaches, os incas, os maias, os astecas, os txucarramães etc. Note-se que os nomes indígenas brasileiros são aportuguesados, sem ‘w’, ‘y’ ou ‘k’.”
O Estado de São Paulo – “Nos nomes estrangeiros, especialmente, preste atenção para que o nome da pessoa seja escrito corretamente. Assim, González (Felipe) e não Gonzales; Rodríguez (Andrés) e não Rodrigues; Walters (Vernon) e não Valters, etc.”
“Nomes japoneses. Os nomes comuns em geral são aportuguesados: saquê, camicase, iene, gueixa, quimono, nô, etc. Exceções: sashimi, karaokê, sukyaki, sushi, tempura, batayaki, ikebana. 2 - Os nomes de pessoas seguem a transcrição ocidental, fornecida em geral pelas agências de notícias: Akihito, Sosuke Uno, Noboru Takeshita, Yasuhiro Nakasone, Kakuei Tanaka. Nos nomes geográficos, o único aportuguesamento que o Estado faz é o de Tóquio. Nos demais casos, use sempre a transcrição oficial: Osaka, Yokohama, Fukuoka, Iwo Jima, Nagoya, Hiroshima, Nagasaki, etc.”
“Nomes geográficos. Não há normas definidas para a grafia dos nomes geográficos. Há os que já estão adaptados ao português (Filadélfia, Londres, Moscou, Bruxelas) e os que deverão ser escritos na grafia original (El Paso, San José, Sydney, New Hampshire). O capítulo seguinte deste volume relaciona os principais nomes geográficos e a forma pela qual o Estado os escreve.”
Folha de S.Paulo – “russos - Translitere segundo a pronúncia aproximada. (...) Lembre-se de que muitos topônimos russos chegaram ao português através de outras línguas e não diretamente do russo. Assim, escreve-se Moscou e não Moskva, São Petersburgo e não Sankt Peterburg.
- chinês - Para a República Popular da China, existe uma transliteração oficial denominada Pinyin, que entrou em vigor em 1979. Ela substitui a velha Wade-Giles, com a vantagem de eliminar os hifens e apóstrofos.
- árabes – (...) A Folha faz algumas adaptações nas transliterações enviadas pelas agências. Substitua os YY e WW por II e UU, respectivamente, exceto quando a combinação resultar numa vogal geminada. Se isso ocorrer, elimine uma delas: Kuwait=Kuuait=Kuait. Substitua o SH por CH: Shatt al Arab=Chatt al Arab. Mantenha o H em qualquer situação que ele apareça.
- outras línguas - São sempre louváveis os esforços para escrever em português nomes de línguas grafadas em alfabetos não-latinos.”
A
Folha de S.Paulo traz ainda muitos mais detalhes para árabe, chinês e russo, que podem ser consultados na íntegra na
edição online do manual. No entanto, há três normas ortográficas gerais, que valem para todas as transliterações no jornal:
- “Use GU antes do E e I. [para o som de /G/ não virar /J/]
- Use SS em posição intervocálica. [para o som de /S/ não virar /Z/]
- Acentue os nomes e topônimos de acordo com as normas do português.”
O manual de estilo das revistas da
Editora Abril segue orientação semelhante à d’
O Globo – isto é, grafar de acordo com a ortografia corrente em português (sem Y ou W, mas abrindo exceção ao K e acentuando quando necessário).
Algumas linguagens e escritas apresentam dificuldades particulares de transcrição, e são tratadas em páginas separadas.
Difere da
transcrição, que mapeia os
fonemas de uma
língua para a escrita de outra. A maioria das transliterações mapeia as letras de uma escrita-fonte para letras de pronúncia similar na escrita-alvo.